O
Palacete de Fafe “surge, assim como uma obra que não tem paralelo na
arquitetura portuguesa, nem mesmo procurando entre os mais vistosos chalets da
burguesia ou em exemplos mais ou menos torreados de casas de “torna-viagem”
Domingos Tavares *
O palacete, de estilo
“chalet”, de dois pisos com planta em L, integra um torreão com terraços e um
jardim.
A sua distribuição
interna apresenta cave com espaços de serviço; primeiro piso, com zona nobre,
composta por sala de jantar, e salas de estar, e num dos corpos cozinha.
Segundo piso com
quartos, salas, sanitários e banho, e pisos superiores do torreão com quartos.
Dependências interiores sem comunicação entre si, servidas por vestíbulos e
corredores.
Decoração
exuberantemente pintada, conjugando alguns elementos neobarrocos com arte nova,
nas madeiras dos lambris, frisos florais pintados nas paredes, integrando
padrões decorativos assimétricos, bandeiras pintadas com paisagens e tectos em
estuque pintados. Cozinha e casas de banho com azulejos simples, com frisos
arte nova, e motivos florais estilizados.
Há muitos anos sem ser
utilizado. O palacete anexo ao Centro de Emprego de Fafe, na rua José Cardoso
Vieira de Castro, encontra-se votado ao abandono e os elementos naturais de
erosão, vão desgastando o imóvel.
Este belo exemplar de Arte
Nova com inspiração francesa foi mandado construir em 1912 por Manuel Rodrigues
Alves, natural do Porto e que viria a casar com a poetisa fafense, Soledade
Summavielle Soares, neta paterna do ilustre “brasileiro” de torna-viagem, José
Florêncio Soares e de Maria Teresa da Costa, primeiros proprietários de outro
extraordinário imóvel de influência brasileira, também devoluto, localizado
mesmo em frente ao Teatro-Cinema local.
Nos anos 60, José
Summavielle Soares recebeu a casa por herança, vendendo-a mais tarde a Alberto
Leite Dantas.
Em 1984 o executivo
camarário promoveu a classificação do palacete como “Imóvel de Interesse
Concelhio”, pelo seu “interesse e valor ao nível artístico, histórico e
cultural”.
A Câmara Municipal chegou a
fazer um projecto visando a recuperação do imóvel, orçado em 130.000.000
escudos. Outra hipótese era uma intervenção parcial que custaria 70.000.000
escudos. Nenhuma das intenções foi viabilizada e a “nobre casa” acabou por ser
adquirida, em 1986, pelo Ministério do Trabalho para instalação do Centro de
Emprego e Formação Profissional de Fafe, construindo-se um edifício de raiz na
zona das antigas cavalariças da casa, ficando o imóvel principal, praticante
sem utilidade.
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Reprodução do "Almanaque Ilustrado de Fafe", 1914
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Na época em que este
palacete foi construído (1912), alguma imprensa local referiu-o como “a mais
luxuosa moradia da vila, com todas as condições para se viver regaladamente”.
Um dos mais emblemáticos e
valiosos imóveis históricos da cidade, em pleno centro urbano, encontra-se
votado ao abandono, aguardando uma recuperação que dignifique o seu
indiscutível valor histórico e patrimonial.
Um exemplar único no país,
com 108 anos de idade, já merecia uma boa reforma!
Governo iludiu e descartou
Respondendo a um alerta do PCP de Braga, o governo afirmou
que "a reabilitação no palacete anexo ao Centro de Emprego de Fafe está
prevista para o final do primeiro semestre deste mesmo ano" (2016).
Depois das garantias dadas pelo Ministro do Trabalho,
Solidariedade, e Segurança Social, que dava como certa a requalificação do
Palacete do Centro de Emprego de Fafe, eis que surge a notícia que, afinal, o
referido Ministério não vai fazer obras no imóvel, propondo a sua venda à
Câmara Municipal de Fafe.
Notícia avançada pelo
“Notícias de Fafe” (Fevereiro de 2018), referiu, que responsáveis do Instituto
de Emprego e Formação Profissional (IEFP), após uma visita de avaliação do
palacete, sondou a disponibilidade da Câmara Municipal para aquisição do
edifício pelo valor de 805 mil euros.
Lembre-se que a casa histórica em questão, datada de 1912,
exemplo único na região e no país, foi classificada como Imóvel de Interesse
Municipal em 1983, para, logo a seguir, em 1986 a Câmara “alienar” o Imóvel
vendendo-o ao Ministério do Trabalho, para instalação do Centro de Emprego de
Fafe, que acabou por ocupar as antigas cavalariças nas traseiras do edifício,
deixando a casa nobre sem qualquer utilização durante cerca de três décadas.
Quando parecia haver luz ao fundo do túnel, e, os mais
crentes pensaram que era desta que aquela pérola do património fafense ia ser
restaurada, tudo se complicou, com a posição do IEFP.
O presidente do Município de Fafe disse ao “Notícias de Fafe”
não estar interessado na aquisição do imóvel pelo valor proposto, considerando:
“é bonito, temos por ele carinho e estima, mas não é muito funcional, é difícil
encontrar um destino, está degradado e até poderá pôr em causa a segurança das
pessoas que por ali passam”.
Raul Cunha disse ainda ao mesmo periódico que “se a Câmara
não o adquirir, será colocado em hasta pública”.
Por seu lado, Antero Barbosa, aconselha o diálogo e a
renegociação referindo que “a autarquia também tem interesse em instalar bem o
Centro de Emprego, num local melhor”, evocando uma permuta “justa”.
O vereador, Victor Moreira, de forma mais incisiva disse ao
“Notícias de Fafe” que “Por mim não pagava nada. Eles ainda tinham de nos pagar
para recuperar o edifício porque a obrigação deles era ter aquilo conservado”,
lembrando que a verba em causa dava para resolver outras situações,
nomeadamente, a aquisição da casa em frente ao Teatro-Cinema, a requalificação
do antigo Mercado Municipal e ainda as necessárias obras de recuperação no
edifício da Casa de Cultura local.
O vereador José Batista, considerou que, “É uma oportunidade de ouro
para fazermos um pacote mais integrador”. Defendendo a compra do imóvel degradado
em frente ao Teatro-Cinema e do Palacete do Centro de Emprego, para instalar a
Loja do Cidadão e centralizar os serviços da Segurança Social.
Prevê-se o relançamento da discussão relativa aos vários
imóveis históricos degradados da cidade, um assunto sensível, dispendioso, que
requer astúcia e engenho do executivo autárquico.
Certo é que não se pode continuar a tapar o Sol com a
peneira. É a altura para encarar, de
forma séria, a questão, suspensa há vários anos, da preservação e
requalificação do Património Histórico na “terra mais brasileira de Portugal”.
O Governo, primeiro responsável pela conservação da nossa
memória cultural, relativamente ao imóvel do Centro de Emprego, teve uma
atitude censurável: comprou, desleixou, iludiu e descartou.
Jesus Martinho
* Ex-professor da Faculdade
de Arquitectura do Porto e investigador
Fontes:
<http://www.monumentos.gov.pt/site/app_pagesuser/SIPA.aspx?id=23130>.
TAVARES, Domingos.
Casas de Brasileiro – Erudito e Popular na Arquitetura dos Torna-Viagem. Porto, Dafne Editora,
2015
Semanário “Notícias
de Fafe”
O interior nos anos 80 do século XX