terça-feira, 5 de janeiro de 2021

O SOL DE INVERNO

 “Está frio. Mas está sol. Pelo menos não chove.” Este é mais ao menos o tema de conversa por estes dias, logo a seguir à saudação de Bom Ano! Mas é inverno, estamos no Norte, não há nada de novo nesta equação e um simples exercício de memória é a prova disso mesmo. Este gelo seco já nos obrigava a ir para a escola todos embrulhados, sem conseguir mexer os dedos na velha carteira inclinada feita de madeira. Ou a fazer rápido o trabalho de matemática para ir à professora mostrar o resultado, só porque havia um aquecedor perto dela. Ou a sair de casa a “bufar” fumo e com a ponta do nariz gelada, vestidos com 4 camadas de roupa que faziam os nossos braços parecer o boneco Michelin. Ou a meter aquele gorro ridículo que não dizia com nada e aquelas meias que até tinham algum borboto, mas eram as mais quentinhas. E as luvas… aquelas às riscas coloridas ou com um dedo de cada cor. Já para não falar da nossa amiga botija. A botija de água quente embrulhada aos pés da cama onde enrolávamos o pijama para quando fossemos trocar de roupa, ou aquele cobertor elétrico ligado à corrente que parecia tirado de um filme de terror. E aquele exercício acrobático de enfiar os pés nas barras do aquecedor a óleo e ficar com eles todos tortos…e ainda levar um sermão porque aquilo ainda pode fazer frieiras?! E aquele ato arriscado de pôr um cobertor por cima do aquecedor que cobrisse toda a gente ou quase… havia sempre alguém a puxar por ele, a destapá-lo e a deixar entrar uma brisa enquanto víamos a Tieta desnudada na televisão ou o anúncio à Thermotebe que a criança tinha e o seu pai também (machismos intoleráveis por estes dias). 

Sair de casa com um manto branco a toda a volta e escorregar na calçada não é de agora. É de sempre! Mas hoje o frio toca-nos mais que outrora. Hoje que temos janelas duplas, ares condicionados, roupas com sistemas tecnológicos anti-tudo... hoje trememos mais que nunca. Estamos frios. Nós! Não o tempo. Pelo menos não chove. Mas é inverno em muita gente que não consegue encontrar o norte e a sorte está do lado de quem encontra um sol de inverno, daqueles que duram mais que uma estação.

Clara Paredes Castro



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