segunda-feira, 7 de setembro de 2020

IGREJA ROMÂNICA DE ARÕES uma escultura erótica com oito séculos


 

Aquando de uma reforma realizada nos anos 40, pela extinta Direcção dos Edifícios e Monumentos Nacionais, foram recuperados alguns exemplares escultóricos, trabalhados em granito, que integravam a decoração artística do templo primitivo dos inícios do século XIII.

Entre esses elementos, cravados num muro periférico do templo, destaco um relevo cinzelado em granito que representa a figura de uma mulher, “exibicionista”, inserida em moldura circular, de cabelos longos, mostrando, exuberantemente, o seu corpo desnudo, ostentando o seu sexo.

A voragem do tempo e a imprudência que conduziu à exposição deste e outros elementos à inexorável acção dos agentes de erosão, já não permitem ver, com clareza, os “atributos femininos” que o artista, certamente, evidenciou.

Trata-se de um espécime singular da iconografia do românico fafense da primeira metade do século XIII. Um exemplar raro da arte decorativa erótica do românico nacional.

A escultura erótica estava muitas vezes presente, no exterior e/ou no interior das igrejas daquela época. Uma herança ligada a rituais pagãos, que, certamente, mais do que provocar o fiel, seria uma advertência para não se sentirem tentados pelo sexo “pecaminoso”.

«São entre outros cristãos imundos, os que mais se entregam à luxúria e às fornicações», escreveu o eminente investigador, António Resende de Oliveira, a propósito da mentalidade medieval do período em foco.

A Igreja terá entendido que a representação artística evidenciando os males do indivíduo, seria uma forma de controlar mentalidades a favor do cristianismo.

Confrontar os fiéis com o bem e o mal, o céu e o inferno, terá sido uma prática comum nos templos românicos, e o de Arões não foi excepção.

Para rematar este apontamento, deixo expressa a minha inquietação e preocupação pelo mau estado de conservação daquele “mostruário” de grande valor patrimonial, junto ao único Monumento Nacional do concelho de Fafe.

Está mais que na hora de recolhe-lo em porto seguro, antes que lamentemos a perda de um testemunho, que já resistiu à passagem de quase oito séculos!

Jesus Martinho


A mesma escultura nos anos 40 do século passado




 


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